26 de mar. de 2008

REFLEXÃO: O que Capão Redondo quer?

O que Capão Redondo quer?

Eiko Lucia Itioka*

Capão Redondo fica no fim do mundo. Incrustado na região sul de Sampa, o distrito foi crescendo como toda a periferia da cidade: a partir de loteamentos irregulares, autoconstrução e grandes conjuntos habitacionais de qualidade discutível, implementados pelo Estado. Repleto de córregos, nos quais o lixo flutua, esgoto a céu aberto, áreas de risco - inundáveis e desmoronáveis. As favelas são muitas, algumas urbanizadas, outras em áreas de mananciais. Os equipamentos e serviços públicos são poucos e precários. Os que funcionam? Dá para contar nos dedos.

Se no centro histórico a população deixou de crescer e se tornou mais velha, em Capão Redondo, como em toda a franja da cidade, há mais crianças e adolescentes e os moradores são, em geral, mais jovens. Infância e juventude massacradas por uma pobreza multifacetada, carentes, abandonadas. Sem educação, hoje, sem emprego, amanhã. Alguém me disse, uma vez, que foram esquecidas pelos deuses e abandonadas pela sorte.

Será que este não é o retrato de toda periferia desta cidade, reconhecida como o carro-chefe da economia nacional, altamente tecnológica, efervescente de cultura e lazer, requintada nos serviços de hotelaria, gastronomia e consumo de luxo, mas com muitos problemas urbanos e principalmente, muito desigual?

Não, Capão Redondo tem algo de especial, pois lá também moram os feios, sujos e malvados... Assim, os moradores de lá são definidos pelos moradores de outros lados. Além de pobre, Capão já foi o campeão em violência e homicídios e perdeu parte de sua juventude, a maioria com idade de 14 a 25 anos.

Hoje, o estigma ainda existe, mas há uma força que vem de lá, impondo respeito. É o resultado de um trabalho silencioso feito por uma rede subterrânea de ações, grupos e entidades, que existe há muitos anos: os incontáveis projetos dos Santos Mártires, o CEDECA, a cooperativa de costureiras, os manos do hip hop, os grafiteiros, o inusitado escritor Férrez com sua literatura marginal, a artista plástica Célia Cymbalista e tantos outros. E, em 1997, Capão também gritou com o Fórum em Defesa da Vida e continuou gritando. Até rompeu com a surdez dos órgãos de governo.

De lá para cá, Capão melhorou? Melhorou. Hoje há muita coisa acontecendo. A juventude anda pela rua, se reúne nas praças, não se esconde mais, procura e faz arte e cultura. Tem festival de música todo ano e já fez sua 4ª edição, em 2007, quando recebeu o guitarrista Stanley Jordan. Festival de teatro, exposição de fotos e artes plásticas, produção de documentários, lançamentos de livros, discos e DVDs, vivem acontecendo por lá e são consumidos por lá mesmo.

Muita coisa mudou, mas ainda falta muito. As crianças continuam sem escola de qualidade, os jovens sem qualificação para o trabalho e sem emprego, o atendimento à saúde é inadequado, as drogas... ih! as drogas, sem falar em habitação, lixo, córregos, transporte. Mas Capão resolveu continuar seu grito: vai processar as instâncias governamentais, pois continua mal servido, sem equipamentos públicos ou quando existem, são de péssima qualidade. Foi notícia de jornais.

Afinal, Capão Redondo só quer cuidar de suas crianças e jovens, quer cuidar de seu futuro. Só quer cidadania. Um poeta de lá, José Neto, diz o que quer: (...) “Sou da periferia e daí? /Tenho por direito, o direito de ser feliz /Ir e vir sorrir e sonhar/Compor versos apagar o sangue/ Limpar as cicatrizes/ (...) Sou da viela, sou da quebrada/Sou da periferia e daí?”.

Março 2008

* Consultora da VM para elaboração do documento de Desenho

25 de mar. de 2008

FASE DE DESENHO - Atualização e novas informações


São Paulo/SP, 25 de março de 2008.

Prezados (as) Companheiros (as),

Como muitos de vocês sabem, ao concluirmos a fase de Diagnóstico do Capão Redondo, iniciamos a fase de construção do Desenho do Programa de Desenvolvimento da Área do Sampa Sul [Distrito do Capão Redondo e circunvizinhança] Neste processo, realizamos vários levantamentos de informações e com diferentes públicos da região, ouvimos crianças, adolescentes, jovens, mulheres, homens, liderança comunitária, líderes cristãos e representantes do governo local.

Muitas informações e dados foram colhidos que unidos a nossa vocação institucional, agora estamos na fase de fazermos as escolhas que serão fundamentais para o programa.

Alguns temas e ênfases já fazem parte das nossas sínteses:

- Sociedade Civil: ênfase no aumento da capacidade das organizações sociais em incidirem nas políticas públicas.

- Meio Ambiente: melhoria dos espaços de moradia e convivência das crianças, adolescentes e jovens.

- Educação: ênfase no fortalecimento do protagonismo infanto-juvenil, entendendo que as crianças, adolescentes e jovens são atores de sua própria história.


Esses temas e ênfases serão componentes importantes no desenho dos projetos do PDA Sampa Sul, e que a partir deles estreitaremos ainda mais nosso compromisso de parceria com as organizações que foram envolvidas nesse processo.

Já temos claro que queremos firmar, a princípio, parcerias com as seguintes organizações:

- Provisão

- Instituto Padre Josimo Tavavares (CEI Luar do Sertão e Pastoral da Criança local)

- Turma da Touca

- CDHEP

- Santos Mártires (Casa Sofia)

- Instituto Rukha (Capão Cidadão)


Para que isso seja concretizado convidaremos os responsáveis legais dessas instituições para uma reunião na primeira semana de Abril, quando escreveremos e assinaremos uma

Carta de Intenções, definindo os parâmetros iniciais de nossa parceria.

A Carta Convênio, instrumento legal de convênio com o PDA, será assinada dia 01 de Outubro deste ano, numa sessão solene, no Capão Redondo.

Vale ressaltar que para ser viável o levantamento dos fundos junto ao parceiro internacional (Visão Mundial Austrália), precisamos garantir a inscrição de 2000 (duas mil) crianças (na faixa etária de 06 meses a 11 anos) atendidas pelos nossos parceiros. Segundo o cronograma, temos que enviar 500 crianças a cada ano fiscal (AF). A estimativa é que cada organização que trabalha com atendimento tenha inscrito, a princípio, 500 crianças que deverão ser beneficiadas direta ou indiretamente através dos projetos que serão desenhados conjuntamente – segundo as três grandes ênfases já explicadas anteriormente.

Todas essas informações estarão [d]escritas de forma detalhada no Documento de Desenho, e para tal, encerramos hoje o processo de contratação da consultora que irá nos ajudar no processo de sistematização das informações e de elaboração do documento que retratará a segunda parte desse processo [primeira parte foi o diagnóstico]. O documento será finalizado até o final de Maio e a devolutiva está agendada para Julho desse ano.

Mais uma vez, agradecemos a cada uma das pessoas e organizações envolvidas nesse processo. Podemos afirmar que aprendemos muito e que temos em mãos informações que são preciosas para nós e para todos que viveram conosco esses quase dois anos.


Atenciosamente,


Raniere Pontes

Gerente da Unidade Operacional São Paulo

Visão Mundial